Quem disse que não dá para viajar para o futuro e para o passado ao mesmo tempo?

Para quem me conhece ou me acompanha, sabe o quanto eu amo viajar. Na newsletter anterior, falei rapidinho sobre uma viagem que fizemos em família final de 2024. Pois bem, agora vou contar um pouco mais que viagem foi essa. Aqui em casa, qualquer viagem é motivo de alegria, independente do destino. É uma oportunidade de estarmos relaxados e mais conectados uns com os outros, além de conhecer outras culturas e lugares.

Meus filhos são descendentes de japoneses por parte do meu marido. Os bisavós deles migraram do Japão para o Brasil. O pai do meu sogro para Belém (PA) e o pai da minha sogra para Pompéia (interior de SP). Sabíamos um pouco da cultura e costumes japoneses do que eles foram repassando de geração em geração. Mas não tínhamos certeza o que encontraríamos quando chegássemos lá, já que muitos e muitos anos se passaram e muita coisa mudou.

Pois bem, um ano antes começamos os preparativos para essa aventura. Voar por praticamente vinte e quatro horas, claro que com uma parada no meio do caminho e levar meus sogros junto parecia desafiador. Fomos portanto em seis pessoas.

Escolhemos fazer escala em Istambul, nos dando de quebra a oportunidade de conhecer uma outra cultura e muita história. Na ida foi uma parada rápida de três horas. Deixamos para conhecer Istambul na volta onde ficamos por quatro dias.

Voltando ao Japão. Desembarcamos no aeroporto de Tóquio quase sete horas da noite e já começamos a aventura nesse momento. Meu marido conhecia um pouco do funcionamento do metrô pois estivera lá antes quando fez a Maratona de Tóquio. Saímos do Brasil com o Suica (cartão virtual que carrega com dinheiro e que pode ser usar no metrô, trem, em lojinhas etc.) instalado nos celulares. Imaginem que éramos dois idosos, dois adultos, um adolescente e uma pré-adolescente. Estávamos com cinco malas médias, quatro de bordo e quatro mochilas. Pegamos o metrô e descemos numa estação bem pertinho do hotel que estávamos hospedados. Ao chegar na estação destino, mais um desafio, subir as escadas com todas aquelas malas (ainda bem que meus filhos são fortes e super nos ajudaram!). Claro que descobrimos depois que existia elevador, mas não era fácil saber onde ficava e naquela altura, exaustos como estávamos o que tinha na frente era a escada. Enfim, chegamos ao hotel e o atendimento na recepção já mostrou a cordialidade, educação e profissionalismo por ali. Eles falam muito pouco de inglês, mas se desdobram para nos atender da melhor maneira possível. E no aperto, todos tem um tradutor eletrônico guardado no bolso.

Dia seguinte, mais uma novidade: despachamos nossas malas para a próxima parada, a cidade de Osaka. Sim, esse é um serviço muito bacana que usamos em todas as cidades que passamos. Um ou dois dias antes da chegada na próxima cidade (depende da localização), é possível despachar as malas de um hotel para o outro. O que muda completamente a experiência de pegar trem e metrô sem ter que carregar tudo isso. Nos programamos para ficar com uma mala de mão cada um com troca de roupa para dois dias e pronto, as malas excedentes podiam seguir seu destino nos poupando um trabalhão. Outro cuidado que tivemos, foi nos hospedarmos em hotéis que tinham máquina de lavar e secar roupa. Na rede de hotéis (local) que escolhemos, elas ficavam dentro dos quartos! Uma mão na roda e nos permitiu levar menos roupa.

Primeiro dia passeamos por Tóquio, mais para fazer compras de roupa de inverno. Assim que coloquei os pés na rua tive a sensação de ter desembarcado no futuro, naquele lugar onde a sociedade deu certo, sabe? Aqui faço um (). Esse relato é pelo olhar de turista! Não faço ideia de como é morar no Japão, como é o dia a dia, trabalhar aqui etc. portanto sem mimimi.

As ruas são impecavelmente limpas e não é porque tem um monte de lixeiras, é porque cada um carrega o seu próprio lixo até que encontre um local onde descartá-lo. Ninguém atravessa a rua com o farol aberto para pedestre, mesmo que não tenha um santo carro passando por ali. Regra é regra. E a segurança então? É algo impressionante. Na verdade é como deveria ser em qualquer lugar, mas infelizmente não é. As pessoas são extremamente corretas e você não fica o tempo todo achando que estão querendo tirar vantagem de você. Filas existem para serem seguidas. E os japoneses fazem fila para tudo e não se importam em ficar lá, pois sabem que sua vez vai chegar.

Depois de uma parada rápida em Tóquio, no dia seguinte seguimos para Osaka onde passamos o Ano Novo. Fizemos o trajeto de trem bala e contabilizamos mais uma aventura. Viagem espetacular. Os trens são ultra pontuais, confortáveis, limpos. No trajeto pudemos apreciar a vista de várias cidades que fomos passando e do Mont Fuji que é majestoso. Foi emocionante vê-lo, mesmo que de longe.

Ao chegarmos no hotel, pasmem, nossas malas já estavam na recepção nos aguardando. Ficamos num bairro mais movimentado e me surpreendeu (negativamente) a cidade bem mais suja. E cheia! Muito cheia. Logo de cara fomos para a Universal, que estava insuportavelmente abarrotada. Filas enormes até para comprar pipoca. Como sabíamos que os parques lá ficam assim, já saímos com um dos vários tipos de passe Express, os fura filas, comprados daqui. Se não fosse isso, dificilmente teríamos conseguido ir nas atrações que queríamos. Numa delas, mesmo com o Express ficamos uma hora na fila.

Osaka foi nossa cidade base para conhecer outras na região. A primeira delas foi Himeji, conhecida por seu famoso castelo, o Castelo de Himeji que é um Patrimônio Mundial da UNESCO. Ele é um dos 12 castelos que permanecem originais sem ter sofrido nenhum dando significativo ao longo de seus quatro séculos de existência. O Castelo é suntuoso e é um mergulho profundo na ancestralidade japonesa. É lindo demais!

Outra cidade que conhecemos foi Hiroshima, que apesar da sua triste história, é uma cidade que expira paz. Não sei como explicar essa sensação. Estivemos na Cúpula da Bomba Atômica, no Museu da Bomba e mesmo assim, ao caminhar pelas ruas a sensação que eu tinha era de paz. A cidade é uma gracinha, limpa e acolhedora. O último bate e volta que fizemos foi à cidade de Nara, conhecida como centro político e religioso do Japão antigo. No Templo Todaiji é possível ver a maior estátua de bronze de Buda no mundo. Aliás, esse é uma tradição que os japoneses levam muito a sério. Nos primeiros dias do ano, os templos ficam lotados. Cheios mesmo, com filas enormes. Em um deles não conseguimos chegar nem perto do templo. Eles vão fazer oferendas e agradecer. E é bem interessante, no caminho ou na frente da entrada dos templos é muito comum encontrar várias barraquinhas de comidas locais. E óbvio que provamos de tudo! Experiência com comida é algo que nós aqui em casa adoramos. Ah, outra informação interessante. É falta de educação comer ou beber andando no Japão. Nessas barraquinhas, as pessoas vão comprando a comida e comem em pé ao lado delas ou em alguns locais, é possível encontrar mesas para comer no melhor estilo picnic.

Nos dias que restaram na região, conhecemos Osaka propriamente dita. O Castelo de Osaka, o bairro do Dotombori, Shinsaibashi, Namba. Osaka é uma cidade mais vibrante do que as que havíamos conhecido até então, e com intensa vida noturna, talvez por isso mais suja. As lojas ficam abertas até pelo menos oito horas da noite. Outro ponto alto da cidade é a gastronomia. Ao lado do nosso hotel, jantamos num restaurante tradicional japonês e escolhemos o omakase (significado é “deixo por sua conta/confio em você”). Nessa modalidade, o chefe escolhe os pratos que vai servir. Geralmente são vários pratos pequenos para irmos experimentando de tudo. Eles sempre perguntam se alguém tem alguma restrição. Esse foi um dos nossos restaurantes eleitos como muito bom.

Nossa próxima parada foi Quioto. Essa cidade ganhou nossos corações. Todos os seis a elegeram como a mais adorada. Ela é uma das mais tradicionais do Japão. Tem templos lindos e muita história. Tivemos a oportunidade de vivenciar uma experiência samurai. Aprendemos a manusear e usar uma katana (espada) vestidos com roupas samurais. Antes porém, aprendemos a meditar e a acalmar o coração e amente, para daí então manusear a katana. Fomos também a uma cerimônia do chá, onde aprendemos o significado de cada passo dessa linda experiência. No final nós mesmos preparamos o nosso matcha seguindo a tradição e os olhares atentos da cerimonialista.

Em Quioto tivemos a oportunidade de jantar num restaurante de omakase de Wagyu (tipo de boi com carne premium). Esse foi o melhor restaurante da viagem. Quioto deixou marcas em todos nós aqui. Comidas deliciosas, paisagens espetaculares, templos, povo super educado, cidade limpa e de quebra ainda vimos uma leve neve caindo numa de nossas noites. De lá, seguimos de volto para Tóquio, para explorar melhor a cidade. Toquio é a junção do futuro com tradições preservadas. As lojas são imensas. Fomos numa papelaria de oito andares, uma de cosméticos de três andares, uma Uniqlo de onze! Não preciso nem dizer que piramos, né? Lojas e mais lojas, óticas que fazem sua consulta na hora e você já sai com o óculos pronto, um zilhão de comidinhas, bares com robôs. Em uma das megalojas de eletrônicos, conforme íamos andando entre os corredores, uma voz saia da prateleira e ia falando com a gente, explicando os produtos, as melhores opções. Tipo um vendedor eletrônico. Em Toquio, uma das coisas que nos marcou foi a experiência num museu interativo, o TeamLabs Planets. É um museu sensorial, onde entramos descalços. Sim, eles tem toda uma super infraestrutura para deixarmos as coisas guardadas. Em um dos espaços, entremos no que seria um rio, água morna, sala escurinha e no rio tinham projeções de carpas. Elas interagiam com a gente! Fugiam conforme chegávamos perto. Foi uma experiência indescritível. Muitas outras coisas interessantes em Tóquio, o restaurante do filme Kill Bill, o Palácio Imperial, Torre de Tóquio, o Shimbuya crossing – cruzamento de pedestres mais movimentado do mundo -, telões imensos 3D.

Foram muitas as experiências, mas no final o que ficou de mais importante foi conhecer a tradição japonesa, a ancestralidade da família, o quanto mesmo com o avanço tecnológico que eles tem, eles seguem valorizando as tradições e o passado. Os momentos que passamos juntos, ver duas gerações tão diferentes, meus sogros e meus filhos, sendo impactados da mesma maneira por todas as novidades e histórias que vivenciaram. Chegamos ao final da viagem ao Japão muito impactados, com vontade de já voltar para lá. Mas, a viagem ainda não tinha chegado ao seu final, era o fim da primeira etapa somente. Próxima parada, Istambul.

Quando optamos por fazer a escala em Istambul fiquei mega animada. Tenho um fascínio por conhecer esses lugares que tanto estudamos nos livros de história. Istambul é a capital da Turquia e uma das cidades mais populosas da Europa. Cortada pelo estreito de Bósforo tem parte territorial na Ásia e parte na Europa.

Assim que desembarcamos, já levamos um choque de realidade. Depois de dias numa cultura silenciosa e organizada, estávamos num lugar barulhento, cheio de gente andando para lá e para cá. Chegamos a noite e estávamos cansados, então jantamos no restaurante do hotel mesmo. E ali já tivemos uma amostra das delícias que íamos provar nos dias seguintes. Em Istambul, optamos por contratar uma guia brasileira que mora lá há trinta anos e não nos arrependemos. Além de facilitar nosso deslocamento, compra de cartão do metrô/trem, nos levar em restaurantes maravilhosos, ela foi nos contando a história de cada lugar que passávamos e não foram poucos. Mesquita Azul, Santa Sofia, Estreito de Bósforo, Palácio de Topkapi dentre outros tantos que fomos. E em cada um deles, mergulhávamos na história. Passear pelo Grand Bazar, pelo Bazar de especiarias, entrar em contato com aquelas cores e sabores, com a cultura local, aprender a fazer negócio com eles, foi inacreditável. Respiramos história durante três dias inteiros. Pensar que pisamos nas terras que um dia já foi conhecida como Constantinopla e tudo o que aconteceu ali. Entender um pouco mais sobre a religião muçulmana, sem viés religioso ou político.

Nossa viagem por lugares tão diferentes e ainda assim tão próximos de certa maneira, acabou depois de vinte e dois dias. Foram dias intensos, caminhamos bastante, vimos e vivemos muitas coisas. Voltamos para o Brasil com a mochila de aprendizados lotada, na verdade transbordando. Tem dias que acordo e sinto uma saudade tão grande de alguns lugares que chega a dar uma dorzinha no coração. Fecho os olhos e consigo, ao menos um pouquinho, resgatar algumas sensações de lá.

No fim, essas experiências nos marcam, nos moldam e nos engrandecem. Isso, não tem preço. Já estou ansiosa para a próxima aventura.

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